Há uma passagem do romance do italiano Giorgio Bassani, O Jardim dos Finzi-Contini, em que Micol
se diverte à custa da suposta ignorância do narrador perante o mundo das
árvores. Ela parece raptada pela nobreza desses seres mudos, ele diverte-se
ostentando um não saber contumaz. Também eu sofro dessa ignorância e isso não é
uma suposição. Não é que não goste de árvores. Gosto muito, mas falha-me a
denominação, melhor falta-me saber adequar os nomes às espécies, pois a botânica
é das coisas mais rasteiras que há em mim, que não sou desprovido de
incontáveis saberes rasos. Há nomes magníficos nesse reino misterioso. Cedros,
faias, olmos, lódãos, ulmeiros, bétulas, plátanos, salgueiros, todas estas
árvores têm nomes que pedem que os escrevamos, tão magníficos eles são. Fantasio
a possibilidade de criar toda uma literatura com esses nomes, explorar as
características de cada árvore, dando-lhe uma alma racional e desejos
humanos, criando-lhe genealogias, dotando-a de tradições e de traições. Isso
porém seria fazê-la cair, expulsá-la do Éden onde habita e misturá-la ao
mundo sombrio dos homens. Abstenho-me de pensar em tal coisa e dirijo-me à
janela. Imagino-me que sou eu que passo na avenida, atravesso a passadeira e empurro
a porta do bar. Debalde, ele continua fechado. Então volto para trás, perco-me
na curva. Daí a pouco oiço a porta da rua a abrir e alguém a entrar. Sou eu. Reúno-me
comigo mesmo, sento-me na secretária e olho o pequeno bosque da escola aqui ao
lado. Os pinheiros estão mais copados e os cedros desenham cones secretos por
amor à geometria. Hoje é quarta-feira, dia 13 de Maio. O mundo contínua envolto
em estatística e até eu me entrego, por desfastio, a exercícios estatísticos.
Vi na televisão umas imagens do santuário da Cova de Iria. Estava vazio, mas
não oferecia a desolação que outros lugares de encontro das multidões oferecem
quando ninguém os habita.
Adoro árvores e gosto de saber o nome delas; até fico triste quando não consigo descobrir o nome de algumas, ninguém parece interessar-se por esse tipo de saber...
ResponderEliminarBem, já percebi que aqui não vou aprender nada sobre árvores... ou será que vou?
É que, às vezes, o HV distrai-se e fala sobre elas :)
Boa Quinta.
🌲
Maria
Falar posso falar, mas sem saber acerca delas. Duas que não referi, mas de que costumo falar são os castanheiros e os jacarandás. E está no tempo de florirem.
EliminarUma boa quinta-feira, Maria
HV
Pois falou, e eu estive mesmo para comentar (sim, porque venho sempre aqui lê-lo), para dizer das saudades que tenho dos jacarandás de Lisboa (aqui apenas existe uma meia-dúzia deles numa rua estreita, espero conseguir vê-los este Junho.
EliminarEste ano perdi a floração das magnólias :(
Por aqui perto não há castanheiros (mas há bouganvílias e glicínias, ambas lindas na floração) e muitos plátanos, sobreiros, azinheiras, carvalhos, cedros, oliveiras, áceres e muitas outras cujo nome desconheço.
Na cidade, na chamada Av. do Liceu, há dois corredores de lódãos que no Verão formam uma espécie de túneis de frescura onde sabe bem passar - e o que eu penei até descobrir como se chamavam, é que nem os mais velhotes sabiam o nome das árvores que lhes davam tão boa sombra...
Um dia feliz.
🌲
Maria
Quando os jacarandás estão dispersos, o efeito perde-se. Enquanto em Lisboa, devido à profusão, é sempre uma sensação de esplendor, noutros lados, como aqui, é preciso sorte com o ano. Há anos em que as árvores têm floração compacta, mas outros é dispersa, o que quebra o feitiço.
EliminarMuito obrigado pela leitura.
Um resto de bom dia.
HV