Pela primeira vez, em meses, ouvi um bando de
pós-adolescentes algazarrear junto ao centro de línguas, na praceta aqui em
baixo. Não faço ideia se o centro reabriu ou se eles se juntaram ali para
descontrair de algum exame feito ou a fazer na escola ao lado. Estavam de
máscara, pareceu-me, mas as vozes elevavam-se com a força que só a inocência
lhes dá, mesmo que seja uma inocência que se julga culposa, crente de que uns
quantos desvios às regras lhes dá uma experiência mundana que porá todos os
velhos de boca à banda. Para aquelas idades, alguém com pouco mais de trinta
anos é um velho irremediável. Quando tiverem sessenta descobrirão que ainda não
são velhos. Continuam a florir os arbustos da escola. Ando há meses a tentar
recordar o nome daquelas plantas, mas ainda não o consegui. Talvez nunca o
tivesse sabido. Na casa de uma das minhas avós havia uma paliçada coberta por
umas trepadeiras que davam umas flores roxas que, abertas, tinham uma forma de
campânula ou sino. Que nome teriam elas? A Botânica não é o meu forte. Ontem o
meu neto veio visitar-me. Mal me vê puxa-me o dedo para vir para a secretária
onde não se cansa de bater no teclado. Depois, quer que eu o empurre na cadeira
do escritório. Estas viagens de cadeira de escritório já vão na terceira série.
Os dias deslizam para o buraco negro de onde, devido à intensidade do campo
gravitacional, nunca conseguem regressar. E com isto resolvi um dos grande
enigmas da humanidade. Por que razão não conseguimos viajar para o passado? A
resposta é simples. O passado não é um país estrangeiro onde as coisas se
fazem de forma diferente, como pensava o senhor Hartley, mas um buraco negro
onde tudo o que nele cai desaparece para sempre. Exausto por esta descoberta,
calo-me para não a estragar.
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