Havia alguns clientes na esplanada, mas no interior o café
estava vazio. Sentei-me lá dentro rodeado pelo sossego da província, tirei a
máscara e arrumei-a longe da vista. A rapariga atendeu-me, e eu desmascarado
passei os olhos pela imprensa. Um estranho hábito. Julgo que o bebi na
infância. Café, pedia o meu pai, e abria os jornais que comprara. Sempre um de
informação geral e outro desportivo. Naqueles tempos havia matutinos e
vespertinos. Eu comia um pastel de nata à colher, embora não recorde a razão para
evitar a parte folhada. Uma das minhas idiossincrasias relativas a comida, a
qual era para mim, até aos dez anos, um poderoso inimigo e motivo de grandes
dissídios com a minha mãe. Odiava comer, coisa que me passou. Dispensava até
que tivesse sofrido uma transformação tão radical. Quando comecei a ler tinha
direito a um livro de aventuras, uma banda desenhada quase sempre centrada no
longínquo oeste. Sempre vivi rodeado de jornais, mas há muito que deixei de
comprar os desportivos. O assunto deixou de me interessar e aquilo tornou-se
uma leitura tóxica. Não é que a imprensa de referência não esteja cheia de
toxinas. Está, mas desenvolvi resistências e aquilo não me faz mal. Julgo,
todavia, que o país não desenvolveu imunidade de grupo. Um dos cafés a que o
meu pai me levava tinha umas cestinhas de figos secos em exposição e, se não
estou enganado, penduradas nas paredes. Os figos eram cobertos por um folha de
celofane amarelo, mas posso esta a inventar. Esse café desapareceu há décadas,
também o meu pai foi para um lugar onde não existe imprensa e onde não se
vendem livros de aventuras, e eu como pastéis de natas à mão e nem a parte
folhada deixo de lado. O sábado progride vagaroso, o silêncio do café
mistura-se com um artigo de opinião. Se gostasse, haveria de ir à praia. Deixei
de gostar. Para não incorrer numa falácia, não infira que não irei, embora eu
não vá.
Adoro cafés e o hábito de ir para lá ler um jornal só me largou durante a pandemia. Os jornais lidos em casa não têm o mesmo encanto, muito menos pela Internet. Por essas coisas é que sei que nasci no século passado e lá me formei.
ResponderEliminar~CC~
De vez em quando, faço-o, mas deixou de ser um hábito regular e tenho, aliás, duas assinaturas digitais de jornais. Quando vou ao café, compro em papel.
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