Os dias seguem enrolados em inexpugnável manto de calor. S.
Pedro, descontente com a vida que se leva por aqui, lança anátemas e raios de
sol para abrir consciências e rasgar peles. Talvez não devesse levantar estas
suspeitas sobre aquele que detém as chaves do céu. Deve-se sempre ter as
melhores relações com quem gere as portas e administra permissões e proibições
de entradas. Segundo consta, nem vale apena argumentar contra decisões
desfavoráveis, pois o porteiro celeste tem mais que fazer do que ouvir
mentiras, ele que sabe toda a verdade. Deveria evitar estes esboços de
mitologia, pois vivemos num tempo desencantado em que ninguém tem saco para
este tipo de conversa. É uma pena. Quem diria que a palavra saco teria tão
grande fortuna. Encher o saco, despejar o saco, meter a viola no saco, não cair
em saco roto, meter tudo no mesmo saco. Ter ou não ter saco, eis a questão. É
possível que toda a metafísica se resuma a ter ou não saco ou seja uma questão
de ensacar e desensacar. Os dias de Verão são sempre difíceis, principalmente
para um narrador que nada tem para narrar. Podia falar da Marília que tornei a
ver com o Zé Tó, ambos com ademanes abrasileirados, um samba excessivo para a
idade deles. Digo eu. Poupo-vos, porém, aos pormenores. Tenho de ir encher o
pneu da bicicleta da neta mais nova. Andar de bicicleta dá muito trabalho.
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