Pela praceta vai um arraial. Não, não se trata de uma festa ao gosto popular por ocasião de alguma romaria, nem um acampamento de tropas inimigas que venha pôr cerco ao castelo. É apenas um grupo de crianças trazidas pelas mães para gastarem as energias físicas e exercitarem a sonoridade da voz em hipérboles estridentes. Bem as percebo, às mães. Terem filhos pequenos todo o dia em casa está muito para além da capacidade de os gerar. Entre o prazer da concepção, se o houve, e as dores do parto, a vida está suspensa. O pior é o crescimento das crias, as metamorfoses do corpo e as mudanças de humor, tudo em territórios exíguos, mesmo que os apartamentos tenham excelente dimensão. Os corpos pequenos precisam de grandes espaços, onde possam crescer e bolsar pelas cordas vogais o espanto pela existência. Ouve-se, agora, a voz cava de um pai. Parece que veio trazer um princípio de ordem. A algaraviada continua, enquanto a tarde se desfaz em neblina e, a coberto das nuvens, se prepara para se deixar cair nos braços da noite. Calma, calma, diz a voz de baixo do pai ordenador. Um rapaz grita que é bola ao ar. Talvez seja. Quando a vida se interrompe também se há-de mandar a bola ao ar, para que ela retome o seu andamento, até que um apito assinale um fora-de-jogo ou o fim da partida.
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