De súbito, olho pela janela e a luz que vejo mais parece anunciar a chegada de Março do que a sua iminente partida. Já de manhã, ao sair de casa, tive esta sensação de desacordo entre a luz que caía e o curso do calendário. O mundo está cheio de desconformidades, as coisas estão fora dos eixos como se lamentava certa personagem teatral. O enigma é que elas nunca estiveram nos eixos e sempre rolaram tempo fora. Há dias, num livro de um psicólogo cognitivo americano na moda, lia uma série de lamentações sobre a péssima qualidade de escrita das novas gerações. O caso, porém, é que essas lamentações se referiam a diferentes tempos da vida americana, desde os dias de hoje até aos da fundação do país. E ele, talvez entusiasmado, citou uma lamentação idêntica, em Inglaterra, pouco tempo depois dos livros passarem a ser impressos. Por fim, concluiu com uma referência às placas de argila sumérias onde tal lamentação já se encontrava com mais ou menos clareza. Dito isto, descobrimos que o mundo não precisa de estar nos eixos para rolar. Acudiu-me uma possibilidade tenebrosa. Se alguma vez os homens pusessem o mundo nos eixos, ele deixaria de rolar, todos nós nos transformávamos em estátuas, provavelmente de sal, e nenhuma novidade, nem vida nova haveria de surgir sobre a Terra. A conclusão desta pobre meditação de um meditante cansado é de louvor à desconformidade, a essa realidade eternamente fora dos eixos. Assim seja. Agora vou vídeo-reunir.
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