De súbito, um aguaceiro cobre os vidros do carro, desfoca a
paisagem, torna imprecisos os contornos de quem passa. Logo o limpa-pára-brisas,
a ruminar vaivéns, devolve ordem ao mundo e figura aos peões. Que monotonia de
ritmo, pensei, enquanto olhava um renque de velhas moradias, daquelas que, com
o passar das estações, já mal suportam o peso da sombra. Mura-as paliçadas de
tijolo e cal e por detrás destas avistam-se laranjeiras e limoeiros,
exuberantes na cor dos frutos, que se escapam dos promontórios verdes das
ramadas. Esta terra não deveria ter nome, murmurei. Não havia ninguém para me
escutar e eu ri-me, a pensar no amargo das laranjas e no brilho baço dos
limões. Os dias já estão mais longos e a hora melancólica do crepúsculo chega
cada vez mais tarde. Se soubesse o que fazer de mim, tudo seria mais fácil.
Assim, perco-me em taxionomias insignificantes e contabilidades sem deve nem
haver.