Um alarme dispara não sei bem onde. O som progride como um
insulto a quem escolheu o silêncio para esquecer a alegria do sol ou algum
dever que a vida, esse naufrágio entre dois esquecimentos, sempre traz no
aconchego da sua farta algibeira. Duas pessoas vão pelo passeio e o seu andar
lembra-me uma redondilha, e logo começo a escandir-lhes os passos, a
espreitar-lhe a prosódia, certo que também o mover dos corpos na rua obedece ao segredo de uma poética, que apenas a distracção nos faz ignorar. O melhor seria pensar
noutra coisa, reflicto, ser útil e dar à indiferença estes pensamentos que são
como flores feias e estéreis. O que vale é que o alarme se calou, e o dia mutilado
refaz a mão decepada e com ela acaricia a infrutuosidade de tudo o que penso.