Hoje é sábado e não sei o que hei-de dizer de um dia assim. Se
estivesse de férias iria comprar um jornal em papel e lê-lo numa esplanada. Não
o estando, evito as esplanadas, as conversas que me assaltam e ferem o meu
desconhecimento do mundo. Preciso do dia para meditar sobre os grandes
problemas da humanidade. Mal acordei, assaltou-me um, e não dos mais pequenos.
Quantos anjos podem dançar na cabeça de um alfinete? Já a exacta formulação da
questão é um enigma. Como em tudo na vida, também aqui se formaram dois
partidos, que se enfrentam com brios sectários, erguer de cruzes e figas para se
protegerem do inimigo. Uns dizem que os gloriosos anjos dançam na cabeça de um
alfinete, outros afirmam, enquanto murmuram anátemas, que o fazem na ponta de
uma agulha. Sobre o lugar do baile, declaro-me agnóstico. Envolvo-me colérico na
disputa teológica sobre se um corpo espiritual ocupa ou não espaço, mas logo me
distraio e começo a pensar em anjos bailarinos, imaginando-os a dançar um
Bolero, talvez um Tango, mesmo um Fandango, pois também os haverá no Ribatejo,
daqueles que protegem forcados e toureiros e que, cheios de afición, hão-de gritar olés, enquanto,
na cabeça de um alfinete ou na ponta de uma agulha, dançam um Paso Doble. Não sei de maior amor à
humanidade do que pensar em anjos. Talvez um dia escreva sobre as potestades, os
tronos e as dominações ou sobre a cláusula filioque,
que nada tem a ver com anjos. Esmagam-me as magnas questões da humanidade.
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