Depois de um almoço tardio, como se tornou hábito às
sextas-feiras, acabei por adormecer sentado num sofá em frente de um jogo de snooker oferecido por um canal
televisivo. Prova provada de que a arte de enfiar bolas num buraco me interessa
muito pouco, embora seja preferível às notícias que outros canais repetem
incansavelmente com a intenção de enlouquecer os espectadores. Adormeci e
ressonei. Pessoas que se prezam não ressonam, mas por muito que me preze não
consigo deixar de ressonar. Ao sentar-me para pagar a corveia, dei uma
espreitadela às notícias online. Uma
empresa oferece 115 mil euros pelos direitos ao rosto das pessoas. Ainda examinei
a possibilidade de vender os direitos do meu, mas reconsiderei. Não é que eu
seja particularmente humano, mas haver um robot com a minha cara com a
finalidade de ser um amigo virtual para idosos é como querer vender-me para ser
amigo de mim mesmo. Coisa que de bom grado dispenso. Pior que isso foi receber
o convite para gostar da página de uma academia jovem de uma agremiação
política daquelas que são novas mas dirigidas por gente que deveria estar
reformada há muito. Pensei, não sem terror, que se vendesse os direitos
do meu rosto, ainda me calhava ser amigo virtual de políticos velhos que em
desespero de causa incentivam a existência de academias jovens. Por menos, foi
Sócrates executado na Grécia. Antes ressonar em frente a um emocionante jogo de
snooker.
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