Cheguei a casa quando o crepúsculo já se anunciava no
descolorido do sol. Sentei-me e os meus olhos embateram numa tradução inglesa
de um livro de um pensador alemão contemporâneo. Os alemães são particularmente
competentes para encontrar títulos dramáticos que soam ora como uma sombra
arremessada pelo infinito, ora como um imperativo a que se deve obedecer,
embora não se saiba porquê. Este pretende resumir a religião através do
imperativo You must change your life.
Peguei no livro, folheei-o lentamente e pensei que mais que mudar a minha vida,
o acertado era ter mudado de vida há muito. Há equívocos que se tornam numa
condenação perpétua. Os pássaros meus vizinhos sublinharam o meu pensamento com
um trilo equívoco e eu sorri agradecido. As vozes lá em baixo calaram-se de
súbito, como se um anjo tivesse poisado e a sua beleza fosse sentida como a
presença do terrível, tal como nos ensina certa ode. Destemido, o vento empurra
os ramos do arvoredo, desenhando murmúrios coloridos na praça vazia. Mudar a sua
vida, que penosa injunção para aquele que se prendeu na teia dos seus hábitos.
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