Cheguei a 2020 cansado, o que não me parece lá muito boa
ideia. O mais indicado era ter aterrado no novo ano em plena forma física,
exuberante e cheio de prognósticos favoráveis. Na verdade a única coisa que me
apetece, agora que o primeiro dia se está a escapulir, é bocejar. Terei dormido
pouco, é verdade. No entanto, é isso que me acontece sempre e não ando por aí a
abrir boca. Quanto ao resto, consta que o mundo não se alterou apesar dos réveillons e fogos-de-artifício. Chegado
de Lisboa, sento-me à secretária e revejo a agenda para os próximos dias. A
realidade, depois de uma semana de fantasia, começa a bater à porta. Bem tento
fechá-la, mas faltam-me as forças. O dia esteve frio, nas ruas as pessoas
vestiam-se como se estivessem no Inverno. Por uma vez não se enganaram na
estação. O ideal, penso, seria eliminar as pessoas destes textos. Apagá-las
sempre que se apresentam em cena ou talvez apagar-me a mim. Pegar numa borracha
e sem pressa ir extinguindo cada um dos meus traços, até que não fique no texto
nada a que possa chamar meu. A isto chamou-se em tempos ascese, o exercício de renunciar
a si mesmo, coisa que caiu em desuso e é vista como uma grave patologia.
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