Uma mulher pousou o cotovelo na mesa da esplanada, depois
apoiou o queixo na palma da mão. Fiquei à espera que, num súbito movimento de
contorcionista, um pé, levantando-se, acabasse por aterrar-lhe na cabeça. Tenho
demasiadas expectativas sobre a humanidade, não admira que me sinta continuamente
defraudado. Ela podia ser uma contorcionista, afinal era só uma mulher
solitária que apoiava a cabeça para olhar o horizonte e beber café. Quando não
se sabe o que se há-de fazer com as pessoas, o melhor é pô-las a olhar o
horizonte. Não foi este o caso. Eu faria dela uma contorcionista, dar-lhe-ia o
melhor dos futuros num circo já sem animais amestrados, a não ser os humanos,
mas ela preferiu olhar em frente, para aquele sítio onde uma linha ténue une o
céu e o mar. Com vagar, um veleiro foi crescendo, rompendo a linha, e eu temi,
confesso-o sem vergonha, que o oceano se entornasse para dentro do céu, ou que
este lançasse sobre o mar alguma coisa que não quisesse nele. A mulher que
podia ter sido contorcionista mexia, com os seus belos dedos, longos e afilados,
o meio pacote de açúcar que depositou dentro da chávena. Eu vi o pequeno monte
de cristais brancos sobre a espuma castanha. Eu vi-os desaparecer tragados por
aquele buraco líquido. Eu vi-a a fazer rodopiar, com a mão direita, a colher dentro
da chávena, enquanto a esquerda lhe segurava a cabeça para olhar o horizonte.
Se eu tivesse um circo, contratava-a para contorcionista de horizontes. Não
tenho, as minhas palhaçadas – de palhaço pobre, note-se – não chegam para
animar o negócio. Também eu fiquei a olhar a linha do horizonte.
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