terça-feira, 11 de agosto de 2020

O peso da verdade

Poderia contar uma história de ninfas a saírem das águas do rio, mas a verdade da narrativa teria tal peso que se tornaria insuportável. Se alguém avistar, como eu avistei, ninfas nas águas de qualquer rio, o melhor é omitir a história, pois não devemos sobrecarregar o mundo dos outros com o peso da verdade. Recolho-me à sombra e protejo-me do sol de Agosto. O ramalhar das árvores e dos arbustos indica a presença do zéfiro e que o dia, aqui neste lugar onde me escondo da realidade, terá um calor moderado.  Ontem nadei, coisa que não fazia há muito. Não se pode dizer que o resultado seja animador. Os corpos sintonizam-se para certas actividades e quando os surpreendemos com outras não programadas, eles nunca deixam de protestar. Há mais de uma semana que oiço, embora sem escutar, as obras para piano de Grieg. É um ouvir despreocupado, uma presença longínqua que me abre para o silêncio, a confissão de que por estes dias cultivo a mais funda despreocupação. Nos arbustos, os nomes escapam-me, fulguram flores a cujas cores também não sei que nome lhes dar. Talvez nada disso exista, pelo menos para mim, pois só existe aquilo que sabemos nomear. No dia em que me esquecer do nome, também eu deixarei de existir.

2 comentários:

  1. ...e eu ouço "clair de lune" enquanto leio o texto.
    fizeram uma excelente combinação.

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